A milícia islâmica Boko Haram, que sequestrou mais de 200 meninas na Nigéria, promoveu um massacre que fez entre 150 e 300 mortos, não se sabe ao certo, no estado de Borno, nordeste do país (ver post). É um dos braços da Al Qaeda no continente.
Digam-me aqui: desde quando as milícias islâmicas aterrorizam o mundo, muito especialmente países africanos? O que fez a comunidade internacional diante do massacre de mais de 400 mil cristãos em Darfur, no Sudão? O mais curioso é que, nos centros influentes de pensamento da Europa e dos Estados Unidos (e até nas universidades brasileiras, que não são influentes), fala-se numa certa “islamofobia”, que ninguém, até agora, conseguiu definir direito o que é ou identificar.
O aspecto religioso dos ataques promovidos por milícias islâmicas na África ou no Oriente Médio desaparece depressa, é logo ignorado. A Igreja Católica e as demais denominações cristãs parecem incapazes de denunciar com a devida gravidade o que está em curso. Ao contrário até: na imprensa ocidental, a esmagadora maioria das notícias acaba tendo um viés anticristão por causa, vamos dizer, da “agenda progressista de costumes”. No mundo, nenhuma escolha pessoal é, hoje em dia, tão mortal como o cristianismo. Nos 45 dias que se seguiram à deposição de Mohamed Morsi, no Egito, pelo menos 200 cristãos da minoria copta foram assassinados. E a matança continua.
Em 2012, escrevi aqui, 105 mil pessoas foram assassinadas no mundo por um único motivo: eram cristãs. O número foi anunciado pelo sociólogo Maximo Introvigne, coordenador do Observatório de Liberdade Religiosa, da Itália. E, como é sabido, isso não gerou indignação, protestos, nada. Segundo a Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), 75% dos ataques motivados por intolerância religiosa têm como alvos os… cristãos. Mundo afora, no entanto, o tema quente, o tema da hora, em matéria de religião — e não é diferente da imprensa brasileira —, é a chamada “islamofobia”.
Existe islamofobia? Sem dúvida. Muitas vezes, no entanto, entra nessa categoria a justa reação de países ocidentais à tentativa de comunidades islâmicas de impor seus costumes à revelia da legislação dos países democráticos que as abrigam. O dado inquestionável, no entanto, é que a “islamofobia” gera, quando muito, manifestações de preconceito — em si mesmas odiosas. Já a “cristofobia” causou a morte de 105 mil pessoas só em 2012. Há lugares em que ser cristão é, com efeito, muito perigoso: Nigéria, Paquistão, Mali, Somália e… Egito — especialmente depois da chamada “revolução islâmica”, ou “Primavera”, na linguagem, vamos dizer assim, floral da deslumbrada imprensa ocidental.
Mas este não é um assunto “quente”. Se algum extremista cretino atacar um muçulmano no Ocidente, aí o debate pega fogo — e não que a indignação seja imerecida. Mas cumpre perguntar: por que a carne cristã é tão barata no imaginário da imprensa ocidental?
Há cristãos sendo crucificados na Síria por jihadistas que promovem a guerra civil contra Bashar Al Assad. Há poucos dias, ao saber disso, consta, o papa chorou. Ocorre que a comunidade internacional, o papa inclusive, tem de fazer mais do que chorar. Quem financia o Boko Haram? Quem dá dinheiro às milícias islâmicas que aterrorizam a África?
É preciso que se chame a atenção para o caráter religioso dessa guerra. A Nigéria, com mais de 170 milhões de habitantes, tem uma discreta maioria de cristãos na comparação com os muçulmanos: 49% a 48%, mais ou menos. Não se tem notícia de milícias cristãs armadas. Reitere-se: o confronto que mais mata hoje na Nigéria e no mundo é religioso, não étnico. E os islâmicos estão na ofensiva terrorista.
Por Reinaldo Azevedo
Fonte: Revista Veja